Exmos. Srs.,
Desejo candidatar-me a um lugar na V. excelente empresa beneficiando
do inovador modelo remuneratório que consiste na substituição do
salário pelo pagamento de despesas de representação. Proponho
representar a V. excelente empresa em vários sítios e ocasiões, a
saber: em três refeições diárias; em todas as minhas deslocações; e
num escritório localizado em minha casa, cujas renda, água, luz e
telefone ficarão, por isso, a vosso cargo.
O facto de abdicar por completo de um salário não significa que o
trabalho que desenvolverei não tenha valor - muito pelo contrário.
Tenho várias ideias que gostaria de pôr em prática ao serviço de V.
Excas. Acompanhei com interesse o processo através do qual a V.
excelente empresa obteve financiamento no valor de 1,2 milhões de
euros com o objectivo de formar cerca de 500 técnicos municipais para
trabalharem em sete pistas de aviação e dois heliportos que têm hoje,
no total, sete funcionários. O projecto falhou, e a Tecnoforma terá
acabado por receber apenas 311 mil euros para formar 122 pessoas.
Creio que o problema podia ter sido resolvido com facilidade
acrescentando à formação a formação de formadores. A formação é
extremamente importante. Nessa medida, é fundamental garantir que os
formadores estão aptos a ministrá-la correctamente. Como? Através da
formação de formadores. Neste ponto, coloca-se um problema: como
garantir que os formadores dos formadores recebem formação de
qualidade? A resposta é evidente: através da formação de formadores de
formadores. E assim sucessivamente, numa espécie de mise en abyme
formativo. Esta matrioska educacional permitiria não só esgotar o
subsídio europeu de 1,2 milhões como também candidatar a empresa a
novos subsídios, na medida em que a formação de formadores, por ser
mais especializada, é mais cara do que a mera formação. O mesmo vale
para a formação de formadores de formadores, em comparação com a
simples formação de formadores.
Acresce a tudo isto que a V. excelente empresa formou funcionários
para trabalharem em aeródromos sem actividade, ou com actividade
residual. Ora, como é sabido, a gestão e controlo de aviões provoca
enorme ansiedade. Mas a gestão e controlo de aviões que não existem
tem potencial para provocar ansiedade ainda maior. Trata-se de uma
espécie de «À espera de Godot» aeronáutico. É uma tarefa muito
inquietante, e nessa medida deve requerer formação adicional.
Por último, li com muito agrado a entrevista do antigo proprietário da
V. excelente empresa, na qual elogia o vosso ex-funcionário Pedro
Passos Coelho por, e cito, «abrir todas as portas». Confesso que me
comovi quando constatei que a abertura de portas era, finalmente,
valorizada como merece. Tendo em conta a minha experiência de cerca de
20 anos precisamente nessa área, creio que sou um bom candidato a
desempenhar funções na Tecnoforma.
Aguardo notícias de V. Excas.
O Porteiro do Ritz
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