Vamos de mal a pior: a caminho da desgraça absoluta, se não houver uma mudança de política. A austeridade só serve os mercados usurários e a troika, criando cada vez mais de-sempregados e o empobrecimento geral, com as exceções conhecidas dos adeptos do Governo, porque esses vivem bem.
A nossa pátria está a ser destruída aos poucos mas sistematicamente, como a maioria esmagadora dos portugueses já percebeu, a começar pela fina flor do PSD e do CDS-PP, isto é, os mais conhecidos e respeitados. Como, por exemplo: Manuela Ferreira Leite, Pacheco Pereira, António Capucho e Rui Rio ou, do CDS-PP, Pires de Lima e Bagão Félix, sem esquecer a maioria dos autarcas, como se viu agora com o insuspeito Carlos Abreu Amorim, dado que não brincam quando as eleições se aproximam...
O Governo Passos Coelho está moribundo, como toda a gente já percebeu. Paralisado, sem rei nem roque nem qualquer estratégia coerente. Como é sabido, o poder efetivo depende do ministro das Finanças, Vítor Gaspar, um economicista fanático, que não é venal (ao que dizem) mas desconhece em absoluto as pessoas e o País em que nasceu. Só sabe de contas e cifrões. Não é ministro das Finanças, quando muito ministro do Orçamento!
Vítor Gaspar e Passos Coelho são uma dupla que se completa e impõe. Paulo Portas, líder do segundo partido da coligação, tem sido humilhado de várias formas. Basta dizer que é a terceira figura do Governo e não a segunda, como seria normal. Às vezes, parece querer impor-se, como aconteceu na semana passada. Puro bluff. O discurso que proferiu, com exigências ligeiras, não serviu para nada. Traçou uma linha vermelha que afinal não respeitou. Passos Coelho, meteu-o na ordem e humilhou-o de novo, no próprio Parlamento, para que ficasse claro. Tirou-lhe o tapete. Porque a ameaça de chantagem feita, discretamente, por Passos Coelho paralisa Portas.
Assim é a vida, com outras - e grandes - dificuldades com um Governo em que os ministros não se entendem entre si. Uns são discretos e não falam; outros não, como o ministro da Economia, que fala pelos cotovelos, mas ninguém o ouve, a começar por Gaspar e Coelho...
Contudo, o senhor Presidente da República reafirmou, publicamente, a legitimidade do Governo Passos Coelho e Vítor Gaspar, depois de os ter ouvido, secretamente, num dos momentos mais agudos da crise. Aceitou a austeridade que, como está provado, mesmo na Europa, só leva à desgraça. Os portugueses não gostaram nada dessa atitude e a sua popularidade, que já era muito baixa, parece ter ficado ainda pior. É certo que as sondagens valem o que valem... Mas a que foi publicada no Expresso de sábado último veio revelar aos portugueses que a popularidade do Presidente se tornou negativa, abaixo de zero, menos 1,2%. O que a ser verdade representa um recorde nunca visto antes, que tem a ver, infelizmente, com a cólera do povo - que já o tem vaiado, como aos ministros - e que se vai expressar, de novo, na manifestação que ocorrerá, junto ao Palácio de Belém, no próximo dia 25.
Seria bom que o senhor Presidente da República refletisse e fosse bem aconselhado, porque os próximos tempos vão ser cada vez mais duros. Não se esperam do Presidente palavras, mas sim ações. Desista da austeridade e não apoie um Governo que o povo abomina - até os banqueiros e grandes gestores - e que segundo a última sondagem vale 25,4% de popularidade negativa.
Agora, convocou um Conselho de Estado para o período "pós- troika" quando se admite um segundo resgate... Note-se que se trata de um Governo insuportável, que em nome de uma troika qualquer está a destruir um grande povo, como o português, a nossa democracia e põe em causa a Constituição (que o senhor Presidente jurou) e tem vindo a desrespeitar, pela segunda vez, o Tribunal Constitucional, com projetos de Orçamento inconstitucionais. Não seja cúmplice - ou pior, protetor - de um tal Governo. Tenha a coragem de o demitir, que o povo - e todas as classes sociais - agradecer-lhe-á. É Portugal e o patriotismo do nosso grande povo que estão em causa, e com isso não se brinca.
De resto, o Governo, em dois escassos anos, só cometeu erros sobre erros e disse disparates. Não ouve ninguém nem dialoga sequer com os parceiros sociais, detesta os sindicatos - seja a Inter seja a UGT - e tem em mira destruir o Estado social. O primeiro-ministro fala, mas decide o que lhe diz Gaspar, sem consultar ninguém e muito menos dialogar com os partidos da oposição e o seu próprio partido. Procede como um déspota, sem prestar contas a ninguém.
Por isso, quando celebrou os 39 anos de existência do PSD, no jantar que promoveu, contou apenas com umas escassas dezenas de militantes presentes. Todos os antigos líderes do PSD e os mais conhecidos dos seus militantes primaram pela ausência. Nem isso o impressionou? Daí que não seja um democrata e que tenha em vista a destruição da nossa democracia e, com ela, a Constituição da República. Este Governo tem de desaparecer. É absolutamente essencial para que Portugal não caia no abismo, que o ameaça.
Como de costume, não se conhece ainda o Orçamento Retificativo que vai apresentar ao Tribunal Constitucional, depois de ter sido recusado, pela segunda vez, como anticonstitucional. Mas conhecem-se os cortes que vão ser aplicados aos funcionários e aos pensionistas, mesmo os idosos. Há hoje mais 30 mil funcionários públicos a despedir, que se acrescentarão aos mais de 420 mil trabalhadores do sector privado que com este Governo já cessaram funções por despedimento. É intolerável o roubo das pensões e uma vergonha, que tem de ser denunciada em todos os tons. Quem pode ter consideração por gente desta, ministros e secretários de Estado?
Pensarão eles que vão passar impunes, porque a nossa justiça é lenta e protege os ricos, mesmo que sejam provadamente gatunos, como todo o País sabe?
Um dia chegará - mais cedo do que tarde - em que tudo mudará na política, nas finanças e sobretudo na ética, para bem de Portugal e dos portugueses. Porque a Europa está toda ela em crise e não vai deixar-se cair no abismo. Seria o primeiro passo para um novo conflito internacional. O neoliberalismo está a desacreditar-se e a globalização desregulada também. Oiça-se o Papa Francisco, que denunciou o neoliberalismo, a política de austeridade e a falta de solidariedade com os pobres. Atrás de tempo, tempo vem. Atue-se enquanto não há violência.
Senão, não. Sempre foi assim...
Mário Soares
DN, 14 Maio 2013
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